Jornal 5

Editorial

Talvez o primeiro artista a pensar a publicação como protesto tenha sido Goya, ao criar Desastres de guerra, que gravou entre 1810 e 1820, sobre as invasões napoleónicas. Goya faleceu em 1828 e só em 1863 a obra foi publicada, devido ao carácter explicito e anti-heroico, com uma
tiragem de mais de mil exemplares da série completa. O título da obra manuscrito pelo autor é Fatales consequencias de la sangrenta guerra em España com Buonaparte.

Nas artes visuais só voltamos a encontrar a publicação como protesto 100 anos mais tarde nos manifestos publicados pelas vanguardas no início do século XX, com as “palavras em liberdade” de Marinetti (Manifesto Futurista, 1909) defendidas num tom polémico e revolucionário.

Num tempo de urgência convidámos para o número 5 do Jornal os artistas Tiago Baptista e Paula Ferreira para pensarem a publicação como protesto em formato de ensaio visual. O que resulta numa história sobre a capacidade de a produção literária gerar resistência efectiva e conta a vida da escritora e antropóloga norte-americana Zora Neale Hurston, nascida em Eatonville, uma pequena comunidade fundada por pessoas escravizadas e que se tinham tornado livres no sul dos Estados Unidos.

paula roush, artista e docente, propõe o outro ensaio visual Government Studies a partir dos protestos e das greves dos professores em Londres, durante o ano lectivo passado, fazendo com os seus estudantes da London South Bank University um percurso de leitura pelos placards, o que resultou na publicação de uma fotozine pela editora msdm (mobile strategies of display and mediation), a casa/estúdio/galeria de paula roush.

José Marmeleira, docente, jornalista e crítico cultural, é o autor do texto Publicar um protesto não é fazer um post, no qual com o apoio de Hito Steyerl e Hanna Arendt, reflete sobre protesto, publicação e espaço público.

Joana Rita, estudante finalista do Mestrado em Artes Plásticas da ESAD.CR, é autora do texto Quatro Rodas de Manifesto. Como refere Alex Danchev na introdução ao livro 100 Artists’ Manifestos a escrita de um manifesto é um acto de optimismo e resiliência.

A comissão científica do Jornal – Catarina Leitão, Isabel Baraona e Susana Gaudêncio – selecionou por método de revisão cega entre pares, o texto A “Alegogíria” de Sebastião Nunes, de Isabel Ávila mestranda na Escola de Belas Artes da Universidade Federal de Minas Gerais, sobre um ensaio visual publicado em 1973 el beef motu perpetua, em contexto de ditadura militar no Brasil.

Num tempo de urgência, quando enunciamos publicação como protesto pensamos em:
— publicação sobre o que se tenta silenciar, ocultar ou omitir
— publicação que alerta para as lacunas e procura a transformação social
— publicação que questiona o modelo dominante
— publicação como lugar de proposições e propostas
— publicação que amplia o debate
— publicação que sai do lugar de conforto
— publicação que é emancipação e utopia
— publicação que diz: o rei vai nu!

O próximo número do Jornal será editado por Isabel Baraona sobre o mote Poesia Visual.

Ana João Romana

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